terça-feira, 31 de julho de 2012

18- A mansão de Lockwood


– Deixa-me ver se entendi direito: Kris tem um “amigo” que mora em São Paulo e amanhã vamos procurá-lo e tentar arrancar alguma informação útil dele. É isto? – ergo uma das sobrancelhas. – E se ele não saber de nada?
– É uma possibilidade – Eduardo encarava o vazio enquanto arrastava as palavras; já era tarde da noite e podiam-se ouvir apenas alguns murmúrios no avião. – Se acontecer, não desistiremos. Temos mais opções.
Eduardo tinha acabado de trocar suas roupas no pequeno banheiro do avião (Uma missão impossível, dissera. De tão pequeno o recinto). Agora usava uma camiseta preta, jeans pretos e All star também pretos. Ele tinha ficado um pouco moreno nos últimos dias – não sei dizer se por causa do sol quente do Paraguai ou se eu estava cada vez mais pálida. Nossos braços se tocando de leve deixavam transparecer que a segunda opção era mais coerente e aceitável.
Seu toque era presunçosamente quente, a tal modo que me eletrizava. Não iria enganar a mim mesma para os sinais que apontava como setas de transito: Estava me apaixonando. Apaixonada. E o que minha intuição dizia e também o que via, era que Eduardo também...gostava de mim.
Mas eu tinha um namorado em Nova Jersey, que me amava e esperava-me. Quanto a isto, não sabia o que pensar ou fazer.
– E estamos ficando sem tempo Eduardo – aponto para a tela do meu Iphone –, já é final de mais um dia. Temos três dias para conseguir duas espadas, que não temos a  mínima ideia de onde estejam. E você fica com pensamentos positivos sobre futuras opções?
Ele balança a cabeça como um pai decepcionado pelas atitudes da filha; aquilo me irritou.
– Seja menos negativa Cathy – novamente ele passa a mão nos cabelos. – Se as coisas estão ruins...
– Podem piorar – completo. Puxo o moletom até os joelhos e me encolho na poltrona, apoiando a cabeça na janela para observar o céu noturno brasileiro...quase sem estrelas.
Eduardo encosta a cabeça em sua poltrona e fecha os olhos negros e torturantes. Ninguém estava pensando em dormir com tão pouco tempo de viagem até São Paulo; dei de ombros e olhei para o relógio: meia noite e dez. Com o atraso do vôo, as paradas e trocas de avião; acabamos por passar um dia inteiro viajando. Tudo porque Alice não queria acordar cedo. Abri meu diário e antes de escrever qualquer palavra, uma ideia perpassou minha mente.
Alice? Chamei via pensamentos.
Fala garota. Ela estava sentada na poltrona à minha frente, ao lado de Kristen. Por causa das orais discussões com Eduardo (assuntos tão banais que até uma criança os mandariam calar), resolveu que sentaria ao lado de Kris nesta viagem. Não tínhamos nos comunicado até agora.
Uma pergunta. Pensei nas palavras certas antes de falar, não queria magoá-la. Eu, por acaso, poderia fechar minha mente para que você não a lesse?  Tipo, é uma questão de privacidade...
Sua voz fina e enjoativa encheu minha mente.
Não estou lendo sua mente Cathy. Nem seus sentimentos. Acontece às vezes de nossas emoções se envolverem...apenas isso.
Até pensando consegui gaguejar.
Mas...você disse...quero dizer...
Eu sei o que disse, retrucou. E sei também que é desnecessário ficar invadindo-a desta maneira. Relaxe, esta livre para pensar o que quiser.
Acho que ela sorriu.
Confie em mim, murmurou. Seus pensamentos não são nada interessantes.
Ri baixinho para não espantar ninguém.
Obrigada, obrigada. Fico comovida.
Depois da melhor noticia que se pudesse receber num começo de dia, abri meu pequeno diário e escrevi sem parar.
Antes é claro, uma boa playlist.
Oásis.


Dezembro, 18 de 2011.

Lá vai:
Apesar de tudo que vem me acontecendo (principalmente a morte de meu amigo Daniel, que ainda me abala muito todas as noites), sinto que não trocaria por vida alguma a que estou vivendo agora. É como se finalmente estivesse encontrado meu mundo – viajar, lutar, amar...seguir em frente. O meu lugar. Talvez pra uma pessoa que prefira coisas calmas e uma vida rotineira não goste do que tenho passado. Mas para mim é como se eu tivesse nascido para isso, por mais que meu jeito mostre o contrário; minha forma física; minhas características. É por dentro que tudo vem mudando.
Eu nasci para isto. E não estou preparada. Estou?
Complicado, extremamente complicado. Acho que posso complicar mais.
Deixe.
Para.
Lá.
(Não vou mais gastar as linhas do diário com bobices. Oh! Estou falando sério).
A madrugada mal começou e já tenho a noticia mais brilhante que poderia imaginar – Alice não gosta de meus pensamentos.
E quem gosta? Tenho dó do curioso que um dia abrir este caderno. Ok, ok. To aqui mordendo o pingente de meu colar que ganhei do Eduardo.
Sim. Exato. Uma asa linda.
Opa, estou me empolgando e isto ta ficando enjoativo. Deixa, deixa, deixa para lá. Acho que estamos chegando no aeroporto de Guarulhos, São Paulo. Eduardo acordou de sua soneca e parece que vamos
Pousar. Eu ia escrever isto. Estamos em um hotel moderno e encantador de São Paulo. Kris ta mandando eu apagar a luz...
Quando terminei de escrever as reticências, Kris socou meu braço. Soltei um “ai” impaciente. Era aproximadamente duas da manhã e ela querida de todas as maneiras a luz apagada. Eu queria ficar escrevendo bobices em meu diário. Insônia. Todo mundo tem insônia.
– Cathy. Estou cansada e se ainda não percebeu temos que acordar cedo amanhã.
Ela não soou rude nem egoísta como geralmente Alice me tratava. Apenas sonolenta. Apaguei a única luz acesa do quarto de hotel e guardei o caderno-diário secreto embaixo da cama.
– Até quem fim – exclamou Alice do outro lado da cama. Kris, Alice e eu estávamos dividindo uma cama de casal; como nós três éramos magrelas e não muito espaçosas, concordamos em dormir juntas.  A outra cama, a única de solteiro, a um metro de mim, aconchegava Eduardo.
E era aquilo que estava me tirando o sono: Eduardo dormindo tão próximo de mim.
Ele roubou meu sono e suspiros naquela noite.


– Cara. Saí desse banheiro! – Uma dica: nunca, jamais, nem sequer pense em dividir um quarto e um banheiro com três pessoas. Eduardo estava há 33 minutos embaixo do chuveiro. Sei que é 33 minutos porque contei no relógio. Faltava apenas eu me arrumar e Eduardo não saía do banheiro. – Vou arrombar esta porta. Pouco me importo de te ver pelado!
[Não estava pensando com muita clareza naquela hora, por isso disse uma barbaridade como esta. Claro que me importo de vê-lo nu...Quero dizer, não queria vê-lo nu, mas sim...ah, esquece!].
– Menina chata – ele gritou do banheiro. – Já vou sair.
Dei um chute na porta sem pensar, e ela se abriu. Eduardo nu me encarou perplexo.
– Ah meu Deus! – E fechei a porta, mal respirando. – Meu Deus – sussurrei, cobrindo a boca com a toalha de banho –, meu Deus.
Minha sorte é que Alice e Kris tinham descido para tomar café; elas teriam me perturbado com o “incidente”. Até ele desligar o chuveiro fiquei rindo como uma boba no quarto, sem saber se corava ou batia a cabeça na parede.


Baguncei meus cabelos molhados e ondulados, respingando água no rosto de Eduardo. Ele limpou as gotas d’água dramaticamente e se curvou sobre mim. Tentei me afastar, andando para trás. Um erro terrível pois tropecei na cama de solteiro e ele teve que me segurar pela cintura para que eu não caísse.
– Opa. – Rimos.
Eduardo era mais alto que eu – minha cabeça batia em seus ombros largos. Ele estava novamente todo de preto e seus cabelos também estavam molhados. Agora imagina um homem desse. Consegue? Aplique ele te empurrando contra a parede do quarto; você não tem pra onde correr...E ele ainda esta sorrindo de canto de boca...tentador não acha?
E sua boca estava próxima demais da minha. Podia sentir sua respiração, seu corpo, seu rosto me preenchendo. Ele apoiou sua testa na minha, se naquele momento estava sorrindo eu nunca soube, meus olhos fechados apreciavam o momento...Seu rosto colado no meu...E uma porta bateu.
– Ah, merda! – exclamou Kristen. Levei um baita susto e sai dos braços de Eduardo, corando. Kris pegou um celular em cima da cama onde dividimos e o colocou no bolso da calça. – Desculpa, não sabia que vocês...
Fiz um rápido aceno de mão e sorri para acalmá-la. Aproveitei para pegar meus óculos também em cima da cama.
– Onde esta Alice? – perguntei para mudar de assunto. – Estou morta de fome, preciso comer.
Ela já estava saindo sem me responder, antes de fechar a porta sussurrou com malicia.
– Camisinha, hein? – E fechou a porta. Depois daquilo eu não soube com que cara encarar Eduardo, invés disso, achei minha bolsa e corri sorrateiramente atrás de Kris, tão corada que podia ser facilmente confundida com um pimentão.

O hotel onde nos hospedamos era pequeno, pois não pretendíamos passar mais que um dia lá. O nosso plano era encontrar o amigo de Kristen naquela mesma manhã – não tínhamos tempo para perder. Então dormimos no primeiro hotel que vimos. E não foi uma má escolha: acolhedor e arrumado o ambiente. Quatro andares e quase todos os quartos ocupados, por onde eu passava no corredor tinha, ou um quadro ou um vaso repleto de flores vívidas; ou um hospede sorrindo com a delicadeza do lugar. Se começasse a sair bolhas de sabão do teto eu não me surpreenderia.
Desci o elevador para o primeiro andar, onde as meninas estavam tomando café no pequeno restaurante do hotel.
Arranquei uma linha solta do meu short jeans e puxei a blusa para o quadril. Calçando um par de All star cano médio vermelho, estava ficando cada vez mais deslocada no lugar. – Quase todas as mulheres usavam vestido de verão e sapatilhas. Fiquei feliz em ver Kristen e Alice de jeans e camiseta. Caminhei até elas enquanto secava meus cabelos curtos (ainda não sentia falta de tê-los grandes), o tempo todo pensando no quase beijo com Eduardo. Mordi com força minha boca para não sorrir com a lembrança.
– Bom dia – Alice comprimento. – Onde esta Eduardo?
Mordisquei um pedaço de bolo e servi-me de café puro, sentei junto delas na mesa. Com a boca cheia respondi:
– Sei lá.
Kristen parecia um cachorro culpado. Ela não podia simplesmente fingir que não viu nada? Mas ela tinha que voltar ao assunto.
– Estraguei tudo não é? – Ela passou o cabelo para trás da orelha. – Olha, não foi minha intenção...você sabe que não...Ah droga ele ta ali...!
E parou abruptamente de falar ao ver Eduardo surgindo atrás de mim. Fingi estar interessada ao máximo na xícara de café, apesar de não ser uma cor que eu gostasse – rosa claro com corações vermelhos. Quase a derrubei propositalmente no chão (“Oh. esbarrei!”).
– Corações? – Eduardo apontou para a xícara, fazendo uma fingida expressão de surpresa. – Sua cara.
Aquilo foi irônico.
Alice pigarreou e saiu da mesa em direção a um garçom. Conversou em um português perfeito com ele e voltou para a mesa. Ou melhor, tirou o café de mim e a torrada de Kris a força.
– Vamos logo – chamou apressada. – O táxi nos espera.
Todos nós seguimos para o táxi estacionado na frente do hotel. Ele era branco, não amarelo. Fiquei surpresa, não por muito tempo: mal pisquei e já estava dentro dele, Kristen a minha esquerda e Eduardo à direita. Alice ao lado do taxista alto e moreno. Lembrei do ultimo táxi que havia entrado, o de Benet em Nova Jersey...e tudo aquilo talvez nem tenha existido – minha mente a grande criadora.
Por todo o tempo da viagem foi um silencio absoluto dentro do carro. Às vezes Eduardo esbarrava os olhos em mim, eu logo os desviava. Não valia a pena investir em um romance ao lado dele...valia? Eu não queria estar apaixonada por ele. Sempre enganada.
Quase dormi pelas duas horas de carro; não tinha interesse algum em olhar para fora da janela. Tudo parecia sem graça e sem emoção...Kris parecia estar adorando até o ar.
– Que lindo! – sempre exclamava. Não via nada de lindo num sol útil para fritar ovo. Assim fechei os olhos e lentamente minha cabeça escorregou até o ombro de Eduardo. Ele gostou de brincar com meu cabelo.
Subitamente estávamos cercados por árvores tão altas que impedia a luz do meio dia invadir meu espaço pessoal. O taxista dirigia por uma estrada de terra e de alguma forma isso não fez parecer que estávamos em uma cidade antiga do interior, mas numa fazenda – uma grande fazenda – longe da vida urbana.
As árvores pareciam não ter fim e pensei como seria bom morar ali: longe de qualquer problema ou pessoas erradas...aquele lugar poderia ser chamado de “liberdade” – emanava calma e serenidade, como quando estamos nos braços de quem amamos. Não havia como sentir medo, principalmente com um céu azul acima.
O carro parou de frente com um grande portão de grades monstruosas. Foi à primeira vez que notei a mansão ao longe; dali era um nada aos olhos nu. Ela foi ficando cada vez maior à medida que aproximávamos pelo terreno. Os portões se abriram assim que paramos, como se nos esperasse.
Como descrever a mansão? Grande...grande demais. E linda. Excepcionalmente linda. Era toda de vidro, mas não se podia ver nada dentro – apostava que podia se ver tudo de dentro pra fora. Dezenas de janelas de madeira branca  cobriam a mansão, dando um toque antigo ao lugar. A porta da frente estava aberta e um menino deixou a cabeça cair quando nos viu, curioso. Ele gritou algo para dentro da casa quando viu o táxi e desapareceu.
Alice abriu a porta do carro e saiu, fizemos o mesmo. Caminhei ao lado de Kris pela grama esverdeada e macia. Depois de termos saídos Alice pagou e agradeceu ao motorista, que voltou para a estrada. Olhei ao redor: lar dos sonhos. Tão espesso e intenso a natureza que deixaria qualquer um sem ar e boquiaberto. Ao longo de todo os lados era apenas grama, como um longo jardim. Algumas dezenas de metros vi o que pareceu ser um estábulo...cavalgar observando os pássaros voando no céu devia ser a melhor experiência de todas.
Subimos nove degraus até a porta principal – a escada brilhava de tão branca...era também de madeira e o corrimão de vidro transparente.
Kristen foi à frente, já que o amigo era dela, e tocou a campainha. Meio segundo depois um serviçal nos recebeu.
– Bem vindos à mansão de Lockwood – e dirigiu-se somente a Kris, com uma reverência. – Há quantos séculos não há vejo, srt. Smain. Um prazer imenso em vê-la.
– O prazer é todo meu Carlos – Kris retribuiu a reverência.
Carlos sorriu corado.
– Entrem. Senhor Lockwood os esperam.
E entramos na mansão de vidro.

Cathy Lohan e os Espíritos da Morte
Por: Carol C.

4 comentários:

  1. Oi, Carol! Você escreve muito bem sabia? Sempre venho aqui pra saber se já saiu mais um capítulo, estou adorando, tá cada vez mais empolgante. Parabéns!
    P.s.: Muuuuiito ansiosa pelo próximo.

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  2. Heey Carol, muito bom o livro, todos os dias venho aqui para ver se ja saiu mais um capitulo, estou muito curiosa para saber o final.
    Beijos e parabéns.

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  3. Eei Carol, cadê o próximo capítulo?? To esperando a muito tempo e nada! Vc n ta de ferias? Aproveita pra escrever mais! Quero ler!! Beijoos

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